quinta-feira, 15 de maio de 2014

Estimule o desenvolvimento da criança com autismo

Dia 2 de abril é o Dia Mundial de Conscientização do Autismo. E diferente do que propõe o senso comum, o autismo não retira uma pessoa do convívio social. Sem dúvida, as habilidades de comunicação são prejudicadas quando há esse tipo de disfunção, mas os estímulos cognitivos realizados na intensidade adequada e com profissionais especializados são capazes de reverter alguns padrões de comportamento. 

"O autismo é uma síndrome comportamental de base neurobiológica, caracterizada por dificuldades de interação social e de comunicação e por padrões restritos de comportamento", afirma a psiquiatra Letícia Calmon Amorim, da AMA (Associação de Amigos dos Autistas) de São Paulo. Mas o tratamento disponível hoje em dia pode estimular uma criança a se desenvolver e ganhar mais independência. 

Não se conhece a causa exata do autismo, tampouco existe cura. Segundo dados do Center of Disease Control and Prevention, dos Estados Unidos, uma em cada 88 crianças está dentro do espectro do autismo. Esta denominação refere-se a todos aqueles que apresentam características da disfunção, que abrange diferentes graus de limitação. Conheça as atividades que ajudam no desenvolvimento da criança que tem essa disfunção.Escolarização 

Letícia Calmon explica que a inclusão é importante, mas o ideal é, inicialmente, fazer o treinamento dos professores e consultar profissionais capacitados para colaborar neste processo, como o psicólogo, o fonoaudiólogo, o terapeuta ocupacional e, em alguns casos, buscar também um acompanhamento pedagógico. "Cada criança deve ter um programa individualizado". A escolarização pode trazer benefícios, como a possibilidade de vivenciar situações sociais e ganhar independência. 
Criança brincando - foto: Getty Images
Brinquedos e brincadeiras

Estimular a criança com autismo a compartilhar seus brinquedos e a brincar com outras crianças pode ajudar muito na interação social. "Os brinquedos para as crianças com autismo devem ser simples e estimular a criatividade", afirma o psicólogo Yuri Busin, mestrando em estudos do desenvolvimento pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, de São Paulo. O mais importante é que os pais e os profissionais observem o nível de desenvolvimento da criança e escolham o brinquedo mais adequado ao nível cognitivo dela. Um psicólogo pode ajudar nessa escolha, já que a indicação presente nas embalagens dos brinquedos não se aplica à crianças com autismo. 
Mão segurando recorte de papel em forma de família - foto: Getty Images
Convívio com a família 

A psicanalista Sônia Pires, da clínica Bem-me-Care, de São Paulo, explica que o primeiro desafio dos pais é aceitar as limitações do filho. "A ideia de um filho sem autismo deve ser abandonada e dar lugar à compreensão das dificuldades da criança", afirma. Estimular a convivência com outras crianças e adultos tanto no ambiente familiar quanto em outros lugares é uma maneira natural de treinar as habilidades sociais e integrar a criança: só não adianta deixá-la isolada, distante do movimento e das conversas.  
Menina fazendo movimentos específicos com as mãos - foto: Getty Images
Lidando com o comportamento característico 

Mexer as mãos sem parar, rodar objetos ou balançar o tronco para frente e para trás são alguns movimentos típicos do autismo. Interrompê-los totalmente é difícil, mas o acompanhamento de um psicólogo pode contribuir para que os gestos diminuam e deixem de atrapalhar a criança.  
Menina colocando a mesa com a mãe - foto: Getty Images
Atribuindo tarefas 

A realização de tarefas depende do nível de cognição e das potencialidades de cada criança. O psicólogo Yuri sugere que sejam propostas à criança tarefas como escovar os próprios dentes, pentear os cabelos ou colocar a mesa, por exemplo, elogiando o desempenho em cada atividade.

É interessante também que os pais estimulem as crianças, fazendo elogios ou criando sistemas de recompensas frente a um comportamento adequado, conhecido como reforço positivo. "Um modelo é a entrega de cartões: juntando dez, por exemplo, a criança ganha um presente ou agrado", explica o especialista.  
Menino correndo - foto: Getty Images
Atividade física 

A psiquiatra Letícia explica que a presença de limitações físicas em pessoas com autismo não é comum. "Isso só acontece quando existem outros problemas associados, como as convulsões". Caso não haja esse tipo de restrição, qualquer tipo de atividade física está liberada e vale a pena consultar um fisioterapeuta para definir qual o melhor esporte para o seu filho.  
Troca de figuras - foto: Getty Images
Comunicação 

Letícia Calmon explica que o mais importante é a criança se sentir apta para se comunicar, mesmo que não seja pela linguagem falada, mas por gestos, sinais e até mesmo pela troca de figuras (sistema chamado PECS) e isso deve ser usado tanto em casa quanto na escola. Para estimular a fala, o ideal é procurar o acompanhamento de um fonoaudiólogo. 

Como colocar limites em uma criança autista?

ESCRITO POR:Evelyn Vinocur
Neuropsiquiatra e psicoterapeuta
foto especialistaO autismo se caracteriza, entre outros sintomas, por rigidez e inflexibilidade do pensamento, linguagem e comportamento. A criança tende a adotar uma rotina própria, com rituais específicos e a apresentar grande sofrimento ao ter que abrir mão dos mesmos, como interromper gestos repetitivos e mudar de ambiente. Por isso mesmo, os pais podem acabar tendo problemas ao lidar com as crianças, e dúvidas como ?cedemos às suas ameaças ou resistimos??. Mas como todo filho, eles precisam de limites para crescerem felizes, com ou sem autismo

A criança autista tem mais problemas em ser contrariada?

Pelo déficit cognitivo, dificuldade de expressar sentimentos, presença de comportamentos obsessivo-ritualísticos, compreensão literal da linguagem, não aceitação a mudanças e dificuldades nos processos criativos, a criança autista pode ter crises de fúria diante das mudanças impostas. Quando contrariada e ouve um "não", ela se vê diante da frustração e pode reagir com muita raiva. 
A imposição precoce de limites nessas crianças é essencial, embora bem dolorosa, principalmente se os pais exageram na emoção ou culpa, perdendo a razão. Uma dica é estabelecer limites já nos primeiros anos de vida da criança, facilitando o seu aprendizado. Quanto antes a criança aprender a lidar com limites, raiva e frustração, melhor será a sua capacidade adaptativa. Cabe aos pais a decisão do que a criança pode ou não fazer e o ideal é que seja feito sem pena e sim com a certeza de que está se fazendo o melhor para o seu futuro.
A definição de regras a uma criança não é fácil, independente do diagnóstico de autismo, tanto que dificuldades em dar limites são amplamente descritas na literatura de crianças com outros transtornos e até em crianças sem problemas aparentes. Em qualquer situação é sabido que o estabelecimento precoce de limites é essencial a qualquer criança, já nos seus primeiros anos de vida. 
Nas crianças autistas, quanto mais precoce for a colocação de limites, menos penoso será o manejo com a criança ao longo da vida e mais fácil será o seu aprendizado e a sua capacidade adaptativa na vida. Quanto mais claros e objetivos forem os pais, mais rápido a criança entenderá o que é esperado dela, facilitando a sua compreensão de quando o "não" é de fato um "não". A autoridade parental deve ser exercida sem autoritarismo e a última palavra tem que ser sempre dos pais. 

Quando o grau é mais severo

Crianças com graus mais severos de autismo certamente demandarão mais esforços parentais na colocação de limites, até por conta dos prejuízos cognitivos e comportamentais serem mais crônicos. É possível que o sistema nervoso central seja mais imaturo e o quociente de inteligência (QI), menor. Tais déficits cognitivos podem dificultar a compreensão do seguimento de regras de obediência, da capacidade de lidar com a figura de autoridade e de interromper uma atividade prazerosa do momento. Casos mais graves têm demanda de definição de limites mais precoce, para uma melhor educação, sociabilização e amadurecimento cerebral bem como na promoção da saúde global do sistema familiar. 

Equilíbrio entre estímulo ao desenvolvimento com os limites

O compromisso dos pais com o estímulo e consequente desenvolvimento das habilidades infantis faz toda a diferença. Só que nenhuma criança é igual à outra. Por isso, cada família deverá seguir uma receita personalizada e única para a criança autista. 
Conhecimento da doença, bom senso e determinação deverão ser levados em conta no manejo da criança. A sua estimulação, portanto, será individual e de acordo com as suas características, cujos limites terão que ser respeitados e dentro do que ela é capaz de suportar. Os estímulos adequados funcionam como reforçadores positivos ao comportamento da criança. 
As habilidades de uma criança autista podem ser altas ou baixas, dependendo do coeficiente intelectivo e da capacidade de comunicação verbal. Com o tratamento precoce e adequado, algumas crianças autistas poderão desenvolver aspectos de independência ao longo da vida. É do equilíbrio entre a estimulação e o freio nessas crianças que elas desenvolverão ao máximo o seu potencial e habilidades de vida, levando-se em conta os seus limites e o contexto ao qual ela se insere. 

Buscando ajuda

As terapias familiares são uma das peças chaves à educação da criança autista. A família não deve abrir mão do seu lazer, bem-estar e de seus limites. A criança autista deve ser tratada como um membro da família e não como um "soberano" ou um doente, a quem tudo é permitido. 
É recomendado que os pais conversem entre si e decidam as regras da casa. Pais de opiniões distintas criam um meio familiar confuso, com vários canais diferentes de comunicação. Sem parâmetros definidos, a criança pode desafiá-los. Ela aprende que insistindo exaustivamente, acabará obtendo o que deseja, pois os pais acabarão cedendo. A criança manipula os pais "tiranicamente", com total subserviência dos pais aos desejos e caprichos da criança. 
Os pais precisam ser firmes e taxativos no olhar, postura, palavras e atitudes. Jamais gritar ou bater. Resistir ao choro e gritos da criança, apenas contendo comportamentos autoagressivos. Uma rotina diária, justa e coerente favorecerá uma relação de confiança, em que os pais instruem e oferecem um modelo positivo a ser seguido. 
Outra dica importante é o diálogo. Espere um momento tranquilo em casa e converse com seu filho, explique os motivos pelos quais você não poderá satisfazê-lo sempre. Por vezes, não dar qualquer alternativa também é uma boa. Se a hora de sair do computador é 17h, ele deverá sair nesse horário e ponto final. Criando costumes com coerência, a criança tende a ficar menos resistente às regras. 
ESPECIALISTA MINHA VIDA